PGT (TESTE GENÉTICO PRÉ-IMPLANTACIONAL)


O teste genético pré-implantacional (PGT) é uma ferramenta diagnóstica adjunta aos tratamentos de reprodução assistida, tradicionalmente utilizada para aumentar as chances de gestação e minimizar o risco de aneuploidia fetal (alterações cromossômicas). O PGT pode ser definido como um teste de avaliação do conteúdo genético de embriões ou ovócitos para a seleção de embriões normais para a transferência.

De maneira técnica, podemos dividir o PGT em sete grupos: (i) PGT para busca de aneuploidias (PGT-A), (ii) PGT para detecção de desordens monogênicas (PGT-M), (iii) PGT para seleção de embriões compatíveis com o antígeno leucocitário humano (PGT-HLA), (iv) PGT para detecção de rearranjos cromossômicos estruturais, como translocações (PGT-SR), (v) PGT combinado, utilizado para busca de aneuploidias e ao mesmo tempo para detecção de desordens monogênicas (PGT-A + M), (vi) PGT para detecção de risco de doenças genéticas não mendelianas, as quais envolvem múltiplos genes (doenças poligênicas) e fatores epigenéticos (PGT-P) e por fim (vii) o PGT não invasivo, que permite a detecção de anomalias cromossômicas (aneuploidias) pela análise do fluido embrionário ou meio de cultivo embrionário. (NI-PGT-A)

 

PGT para aneuploidias cromossômicas (PGT-A)

O PGT-A permite a detecção de aneuploidias, ou seja, anormalidades cromossômicas numéricas, dos 24 cromossomos (22 autossomos e sexuais – X e Y, FIGURA 1) por técnicas de biologia molecular a partir do DNA extraído do embrião. Para tal, é realizada uma biopsia embrionária em que uma ou mais células do embrião são extraídas. Os embriões considerados euplóides (com conjunto normal de cromossomos) podem ser então transferidos para o útero ou criopreservados.

FIGURA 1: Anomalias cromossômicas numéricas, com adição (trissomia) ou redução monossomia) de um cromossomo.

 

Existem três abordagens usadas para avaliar o DNA de embriões: a biópsia do primeiro ou segundo corpúsculos polares do ovócito; a biópsia dos blastômeros no terceiro dia de desenvolvimento do embrião; e a biópsia do trofoectoderma (TE) do blastocisto no quinto ou sexto dia de desenvolvimento (FIGURA 2). A biópsia do TE é a mais atual e como mais células podem ser removidas nesse estágio, potencialmente permite um diagnóstico mais preciso.

 

FIGURA 2: Biópsia do corpúsculo polar do ovócito; biópsia de blastômeros e biópsia de células do trofoectoderma.

 

Considerando que a aneuploidia é a principal causa de abortamentos recorrentes e falhas repetidas de implantação, o PGT-A pode aumentar as taxas de gestação e de nascidos vivos, diminuir a chance de aborto e o risco de se ter uma criança afetada. Portanto, o PGT-A é indicado para casais inférteis que não tenham qualquer histórico familiar de doenças genéticas hereditárias, casais com cariótipos normais que tenham vivenciado abortamento de repetição, falha repetida de implantação ou casais que tenham um filho afetado. O PGT-A também é indicado para casos de idade materna avançada (≥38 anos) e casos de fator masculino grave. Outra indicação do PGT-A é a seleção do sexo em casais com histórico de doenças ligadas ao cromossomo X.

Dentre as técnicas de biologia molecular utilizadas para estudar as aneuploidias a partir do DNA do ovócito ou embrião, a mais recente é o sequenciamento de nova geração (NGS). O NGS nos permite observar a quantidade de material genético dos embriões. Após as análises moleculares, os embriões podem ser divididos em duas categorias gerais: euplóides que são aqueles que apresentam um número normal de cromossomos (46 cromossomos: 22 pares de autossomos e 1 par de cromossomos sexuais) e têm mais chances de implantar no útero e levar a uma gravidez bem-sucedida e; aneuplóides que normalmente não resultam em uma gravidez ou podem levar ao nascimento de uma criança com uma condição genética pois apresentam um número anormal de cromossomos.

 

PGT para detecção de desordens monogênicas (PGT-M)

PGT-M é utilizado para detectar doenças monogênicas, ou seja, de um único gene. Tais desordens acontecem por mutações em uma região definida do DNA ou em um gene específico (FIGURA 3). Anemia falciforme, fibrose cística, distrofia muscular de Duchenne, doença de Tay-Sachs, síndrome do X Frágil, talassemia e atrofia muscular espinhal 3 são exemplos de distúrbios monogênicos.

 

FIGURA 3: Mutação em uma região definida do DNA.

 

Atualmente é possível realizar PGT-M para qualquer doença genética a qual se conheça previamente a mutação, mesmo que seja uma mutação rara. As mutações são muitas vezes hereditárias, portanto, casais com histórico familiar de doenças monogênicas são susceptíveis a ter uma criança afetada.

No Brasil mais de 100 tipos diferentes de doenças monogênicas já foram detectadas através do PGT-M, porém, um grande desafio da técnica é a baixa quantidade de DNA embrionário recuperada para sua realização. Normalmente através da biopsia embrionária são retirados apenas uma ou menos de uma dezena de células. Portanto o PGT-M é diferente e mais complexo que os testes genéticos pré-natal e pós-natal. Para aumentar a concentração de DNA na amostra são necessárias técnicas de amplificação de DNA, como reação de amplificação em cadeia de polimerase (PCR, FIGURA 4) ou amplificação do genoma inteiro (WGA).

FIGURA 4: Reação em cadeia de polimerase com separação das cromátides por ação enzimática e ligação de aminoácidos correspondentes, presentes na amostra para a formação de cópias do DNA.

 

PGT para seleção de embriões compatíveis com o antígeno leucocitário humano (PGT-HLA)

Outra importante aplicação do PGT, apesar dos debates éticos, é a tipagem HLA. O PGT-HLA é uma nova abordagem para o tratamento de doenças congênitas ou adquiridas, para as quais ainda não há terapia disponível. Por meio desta técnica é possível identificar embriões com HLA compatíveis com o HLA de irmão mais velhos para um futuro transplante de células-tronco. As células-tronco hematopoiéticas são coletadas do sangue do cordão umbilical ou da medula óssea do irmão doador para serem usadas para transplante e cura do irmão afetado.

De fato, a chance de se encontrar um doador com compatibilidade HLA, mesmo dentre membros da família, é limitada, portanto o PGT-HLA surge como uma ferramenta prática e atraente para terapias com células-tronco.

 

PGT para detecção de rearranjos cromossômicos estruturais (PGT-SR)

PGT tem uma utilidade especial para casais portadores de alterações cromossômicas estruturais que envolvem rearranjos estruturais ou translocações. Os rearranjos estruturais são relativamente comuns e dependendo do tipo, o rearranjo cromossômico estrutural poderá levar ou não a desequilíbrio genômico e consequentemente podem ter ou não um efeito fenotípico.

Isso ocorre porque os rearranjos estruturais podem ser equilibrados (translocações e inversões), caso o genoma tiver o complemento normal de material cromossômico ou desbalanceados (deleções e duplicações), se houver material ausente ou adicional (FIGURA 5).

 

FIGURA 5: Esquema de translocação com quantidade normal de material cromossômico (translocação balanceada) e com adição de material cromossômico (translocação não-balanceada).

 

Os rearranjos estruturais são predominantemente equilibrados e seus portadores geralmente não apresentam sinais ou sintomas clínicos. Os rearranjos podem ser transmitidos para a prole, porém a segregação meiótica pode levar a formação de gametas com rearranjos estruturais não-equilibrados, podendo resultar em abortamento, morte fetal ou nascimento de uma criança afetada, com sinais clínicos.

Alguns exemplos de anomalias causadas por rearranjos não equilibrados são: Síndrome Cri-du-chat, Síndrome de Williams, Síndrome de Russel Silver, Síndrome de Prader-Willi e a Síndrome de Angelman.

O PGT-SR tem então como objetivo distinguir embriões equilibrados daqueles não equilibrados. Para tal, métodos como a hibridização in situ fluorescente e microarray podem ser utilizados. Mais recentemente a tecnologia NGS tem sido utilizada, permitindo a avaliação e todos os cromossomos.

 

PGT combinado (PGT-A + M)

O PGT-M e o PGT-A podem ser realizados simultaneamente na mesma amostra de biópsia embrionária em uma estratégia baseada no PCR em tempo real (RT-PCR). Este teste é recomendado para casais em que um dos parceiros é portador de um distúrbio monogênico e tem uma das indicações PGT-A, como por exemplo idade materna avançada.

 

PGT para risco de doenças poligênicas (PGT-P)

O advento de novas tecnologias, como o NGS, que permite a análise de todo genoma, abriu caminho para o estudo de doenças genéticas não mendelianas, que envolvem múltiplos genes e fatores epigenéticos. Sendo assim, hoje é possível estimar o risco de determinadas doenças, em um dado embrião

Enquanto a Organização Mundial da Saúde estima que aproximadamente 1% dos recém-nascidos possua um distúrbio monogênico, 15 a 25% dos seres humanos morrerão prematuramente por doenças não transmissíveis da forma mendeliana, que se originam predominantemente de distúrbios poligênicos.

As doenças poligênicas, também conhecidas como doenças multifatoriais, são um conjunto de doenças hereditárias produzidas pela combinação de múltiplos fatores ambientais e mutações em vários genes (vários marcadores genéticos), geralmente de diferentes cromossomos.

Sendo assim, no PGT-P, o risco de um indivíduo apresentar determinada doença é calculado através de um Score, gerado a partir de dezena de milharas de marcadores distribuídos por todo nosso genoma.

Algumas das doenças poligênicas, das quais o risco pode ser estabelecido por meio de PGT-P são: asma, fibrilação atrial, carcinoma de célula basal, câncer de mama, cálculos biliares, glaucoma, gota, ataque cardíaco, colesterol alto, hipertensão, hipotiroidismo, melanoma maligno, câncer de próstata, câncer testicular, diabetes tipo 1 e 2.

 

PGT não invasivo (NI-PGT)

A biópsia embrionária, independentemente do estágio de desenvolvimento do embrião em que é realizada, é um processo invasivo. Porém, existem duas alternativas à biópsia invasiva: a blastocentesis (FIGURA 6), que consiste na aspiração e posterior análise do fluido do blastocisto, e o exame dos meios de cultura onde o embrião foi cultivado (FIGURA 7).

A blastocentesis é realizada do lado oposto à massa celular interna, deixando o embrião totalmente colapsado, porém, o colapso dinâmico e a reestruturação da cavidade do embrião é um fenômeno fisiológico, rotineiramente observado durante a prática laboratorial e a perda do fluido do blastocisto não deve ser prejudicial ao embrião. A análise do fluido embrionário permite a avaliação de fragmentos de DNA com bastante acurácia, porém a amplificação do DNA para realização da técnica ainda tem sido falha.

FIGURA 6: Blastocentesis: aspiração e posterior análise do fluido do blastocisto.

 

A análise dos meios de cultivo embrionários permite a avaliação do DNA livre celular, que é liberado no meio de cultivo. Apesar de ser uma técnica simples, sem a necessidade de um embriologista experiente para a coleta do material, diversas variáveis podem afetar o resultado como: volume de meio de cultivo, tipo de cultivo embrionário (sequencial ou em único estágio), origem do embrião (fresco ou descongelado), etc.

FIGURA 7: Análise do meio de cultura onde o embrião foi cultivado.

 

Os principais riscos associados a esse tipo de PGT são a contaminação genética (DNA materno, paterno ou de laboratório), a maior taxa de morte celular em embriões aneuplóides e dependência da rotina laboratorial. Muitos estudos têm sido realizados nos últimos anos para avaliar essa técnica e muitos deles relataram taxas de sucesso moderadas.

 

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